Identificar e Conhecer
Constatada a baixa frequência escolar, segue-se a caracterização da realidade do(a) estudante para identificar e conhecer os motivos estruturais, visando à integração de dados e informações sobre as trajetórias escolares e a situação dos(as) estudantes, antes do encaminhamento a outros serviços. Identificar e conhecer, nesse sentido, são ações que caminham juntas, pois há uma ligação entre ambas. Como é possível para os(as) profissionais das instituições escolares identificar o fenômeno que revela a vulnerabilidade que crianças e adolescentes em situação de pobreza estão vivenciando?
De acordo com a legislação, há obrigatoriedade de inserção da criança na Educação Básica a partir dos quatro anos de idade, estendendo sua permanência até os dezessete anos. Entretanto, entre a política pública e a realidade, há intersecções estruturais de fundo social, econômico, cultural, familiar e pedagógico que expõem crianças e adolescentes a situações de vulnerabilidade, as quais podem resultar na repetência, abandono e evasão escolar.
São diversos os fatores que afetam a permanência de crianças e adolescentes na escola e que contribuem para desestimular a frequência escolar. Entre estes, podemos citar a baixa frequência relacionada à suspensão escolar. Nesses casos é preciso atuar de maneira intersetorial para que, através dos encaminhamentos extraescolares, os(as) profissionais de educação possam acionar a rede de proteção social. Dentro da escola, em primeiro lugar, é preciso reconhecer que a ação de suspensão, quando seguida da baixa frequência, não teve um resultado pedagógico exitoso, pois pode transmitir ao(a) estudante, sobretudo aqueles(as) em situação de pobreza cuja cultura escolar ainda não esteja apropriada, a visão de que a escola não é lugar pra ele(a), ao invés de contribuir com o seu processo formativo.
A suspensão escolar figura para os(as) estudantes, em muitos casos, como última opção ou como punição por alguma ação, particular ou repetida, considerada indevida pela comunidade escolar. É importante lembrar que a escola se constitui como um importante lugar de socialização para os(as) estudantes, lugar que contribui na constituição de suas identidades e na qual a suspensão resulta no impedimento do acesso à escola como um local de formação em um sentido amplo. É preciso estar atento nos efeitos que uma suspensão pode causar nos(as) estudantes, como sentimento de vergonha, de impotência, de não pertencimento, o que pode fazer com que tal ação, mesmo que motivada pedagogicamente, tenha efeitos contrários à própria finalidade formativa e inclusiva da escola.
É preciso levar em conta, também, que os problemas de frequência escolar relacionados à suspensão precisam ser pensados de forma mais profunda, tanto como objetos de autorreflexão da escola em relação aos próprios limites da suspensão como medida pedagógica, quanto na necessidade de um olhar mais complexo para as ações dos(as) estudantes que motivaram a medida de suspensão. Essas ações dos(as) estudantes podem estar relacionadas a diversos fatores, como com questões sociais, educacionais e familiares, com a negligência de familiares e responsáveis, a reprodução e a manutenção do preconceito e a discriminação no ambiente escolar, seja na forma de bullying ou cyberbullying – violência praticada em ambiente virtual –, entre outros. Considerando um olhar mais profundo para as situações de baixa frequência relacionadas à suspensão escolar, como é possível acompanhar e encaminhar essas situações?
Acompanhamento intersetorial dos casos identificados
Como a escola está organizada para o acompanhamento do(a) estudante?
Quando a baixa frequência do(a) estudante é relacionada com casos de suspensão escolar, estamos diante de uma situação extrema e complexa, na qual a escola pode iniciar um movimento de autorreflexão sobre os motivos que geraram a suspensão, muitas vezes atrelados à lógica punitiva por ações de estudantes compreendidas como inadequadas, e que levam à baixa frequência e a seus possíveis desdobramentos, como a repetência, o abandono e a evasão escolar. Compreender profundamente as ações dos(as) estudantes e o teor educativo da reação da escola pode ser configurado como um dos grandes desafios para a situação de baixa frequência por suspensão escolar. Nesse sentido, a instituição escolar pode encaminhar internamente formas de avaliar o resultado pedagógico que tiveram e que teriam eventuais suspensões. Essa avaliação é realizada por um coletivo, composto pela coordenação pedagógica e professores(as). Tal coletivo não poderia avaliar também a possibilidade de outras medidas pedagógicas possíveis de serem tomadas antes de chegar em medidas extremas, como a suspensão?
É importante lembrar que, no ambiente escolar, o(a) estudante em situação de pobreza e em vulnerabilidade também pode vivenciar situações indesejáveis e preocupantes, como aquelas relacionadas ao preconceito, à discriminação etc. cuja reação deles a essas situações reproduzam comportamentos violentos de difícil aceitação para a escola, resultando muitas vezes em medidas como a suspensão escolar.
Promover conversas com a família sobre o que motivou a suspensão pode ser uma forma de identificar possíveis motivos mais profundos das ações dos(as) estudantes que geraram a suspensão. O que a escola identifica sobre a realidade do(a) estudante nas conversas com a família? Como o conhecimento dessa realidade do(a) estudante poderia contribuir para pensar também outros encaminhamentos pedagógicos dentro da escola e com outros parceiros?
A compreensão profunda dos fatos que resultaram no procedimento extremo da suspensão exige, em grande parte dos casos, articulações com a família, com o(a) gestor(a) do PBF e com o Conselho Tutelar e/ou Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente. A escola pode encontrar apoio para o desenvolvimento de ações conjuntas e complementares com a criança, o adolescente e as famílias através do Sistema Único de Assistência Social (SUAS).
Além da compreensão de encaminhamentos que precisam ser adotados pela escola, a articulação desta com esses outros setores poderia contribuir para uma percepção mais complexa, que permita vislumbrar a possibilidade de outras medidas pedagógicas de superação dos fatos que estariam motivando a suspensão escolar.
Conheça o fluxo socioassistencial para acompanhamento
É importante ressaltar que o encaminhamento socioassistencial não finaliza o acompanhamento pedagógico, pelo contrário, é a ação conjunta dos distintos setores que podem colaborar para a compreensão da heterogeneidade que envolve os motivos que levam à baixa frequência e à evasão de crianças e adolescentes beneficiários(as) do PBF. Estando estes(as) inseridos(as) em contextos de privações materiais e subjetivas, ou seja, em situações de vulnerabilidade e pobreza, a escola pode encontrar apoio para articulação de ações conjuntas com outros setores das políticas públicas, como os da área da Saúde e/ou Assistência Social. No caso do motivo presente, o fluxo abaixo pode ser utilizado pelos(as) profissionais da educação a fim de efetivar uma rede de proteção que permita o acesso integral de crianças e adolescentes beneficiários(as) do PBF à cidadania.
CRAS: Centro de Referência de Assistência Social
PAIF: Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família
SCFV: Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos
Gostaria de baixar as sugestões extraescolar desse encaminhamento?
BaixarReferências Bibliográficas
BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9394.htm. Acesso em: 18 nov. 2018.