Identificar e Conhecer
Constatada a baixa frequência escolar, segue-se a caracterização da realidade do(a) estudante para identificar e conhecer os motivos estruturais, visando à integração de dados e informações sobre as trajetórias escolares e a situação dos(as) estudantes, antes do encaminhamento a outros serviços. Identificar e conhecer, nesse sentido, são ações que caminham juntas, pois há uma ligação entre ambas. Como é possível para os(as) profissionais das instituições escolares identificar o fenômeno que revela a vulnerabilidade que crianças e adolescentes em situação de pobreza estão vivenciando?
No caso da escolha do trabalho em detrimento da escola, sobretudo entre crianças e adolescentes beneficiários do Programa Bolsa Família (PBF), há uma relação explícita com necessidades insatisfeitas e falta de acesso em múltiplos âmbitos (escolaridade, alimentação, saúde, moradia, transporte, entre outras). As desigualdades sociais que marcam as famílias em situação de vulnerabilidade social e pobreza podem levar o(a) estudante a assimilar que a inserção no mundo do trabalho pode garantir alguma inclusão social, ainda que futuramente possa configurar exclusão por má qualificação profissional. Soma-se a isso trajetórias escolares geralmente marcadas por círculos viciosos de reprovação, de distorção idade-série e de evasão, que desestimulam o(a) estudante, gerando neles(as) a sensação de fracasso e inadaptação para o ambiente escolar.
Nesse sentido, ainda que o(a) estudante enxergue o ensino como potencial transformador de sua realidade, o sentimento de incompetência pode criar uma ideia de “perda de tempo”. No caso de trabalho infantil, é importante ressaltar que tal situação caracteriza-se como violação de direitos.
Devido à grande possibilidade de risco social, é relevante que, além de identificar a baixa frequência pelo motivo de trabalho, os(as) profissionais de educação conheçam a realidade concreta das crianças e dos(as) adolescentes beneficiários(as) do PBF que permeiam essa circunstância. Qual é a idade do(a) estudante (acima de 14 anos é possível trabalhar na condição de menor aprendiz)? O(a) estudante está numa relação de emprego de exploração? Há um incentivo da família para a continuidade dos estudos? Qual é a atividade produtiva e econômica da família? O corpo docente identificou mudanças no desempenho escolar?
Para que a criança e o(a) adolescente possam superar as dificuldades vivenciadas, é necessário que a escola faça encaminhamentos intraescolares, voltados para uma organização pedagógica que favoreça uma articulação entre a escola e a família; e extraescolares, relacionados com uma articulação intersetorial com outras políticas públicas.
Acompanhamento intersetorial dos casos identificados
Como a escola está organizada para o acompanhamento do(a) estudante?
É importante compreender a ação de encaminhar dentro de uma perspectiva integral e integrada, ou seja, em uma articulação conjunta e intersetorial que favoreça o acompanhamento pedagógico e socioassistencial. Dentro da escola, o motivo de trabalho do jovem precisa ser pensado coletivamente para que se formule um acompanhamento pedagógico que estimule os(as) estudantes a investir em seus estudos. Nesse sentido, é importante não responsabilizar apenas os(as) estudantes por suas trajetórias escolares, mas fortalecer o vínculo entre a famílias, para que esse(a) seja incentivado(a) em múltiplos espaços. Os(as) profissionais da educação podem pensar em estratégias que tragam a família para dentro do ambiente escolar, fortalecendo os laços entre os distintos atores que compõem a comunidade escolar e entre estudantes e responsáveis familiares. Desse modo, para além de reuniões pedagógicas, é importante pensar em situações que gerem um sentimento de identidade com a escola, como gincanas, feiras e atividades ligadas a características regionais e territoriais.
Além disso, a escola pode encontrar apoio para o desenvolvimento de ações conjuntas e complementares com a criança, o(a) adolescente e as famílias, sobretudo com os(as) beneficiários(as) do PBF, através do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). No caso do fortalecimento da função protetiva da família, prevenindo a ruptura dos vínculos, a escola pode encaminhar para o Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF), que fará um trabalho continuado com as famílias territorialmente credenciadas nos Centros de Referência da Assistência Social (CRAS). É possível, também, o encaminhamento de crianças e adolescentes que estejam fora da escola ou em defasagem escolar ao Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), que tem entre seus objetivos contribuir para a inserção, reinserção e permanência dos usuários no sistema educacional. O acompanhamento socioassistencial é fundamental para que os fenômenos possam ser enfrentados em sua totalidade, viabilizando o direito e o acesso à educação.
Conheça o fluxo socioassistencial para acompanhamento
É importante ressaltar que o encaminhamento socioassistencial não finaliza o acompanhamento pedagógico, pelo contrário, é a ação conjunta dos distintos setores que podem colaborar para a compreensão da heterogeneidade que envolve os motivos que levam à baixa frequência e à evasão escolar de crianças e adolescentes beneficiários(as) do PBF. Estando estes(as) inseridos(as) em contextos de privações materiais e subjetivas, ou seja, em situações de vulnerabilidade e pobreza, a escola pode encontrar apoio para articulação de ações conjuntas com outros setores das políticas públicas, como os da área da Saúde e/ou Assistência Social. No caso do motivo presente, o fluxo abaixo pode ser utilizado pelos(as) profissionais da educação a fim de efetivar uma rede de proteção que permita o acesso integral de crianças e adolescentes beneficiários(as) do PBF à cidadania.
CRAS: Centro de Referência de Assistência Social
PAIF: Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família
SCFV: Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos