A organização do tempo pautado em aulas de 50 minutos, o conteúdo compartimentado, a organização das etapas em série, o ensino centrado no repasse de conteúdo e não nos sujeitos são elementos da cultura escolar brasileira, de origem colonial, que predominam nas escolas de Educação Básica, sejam elas públicas ou privadas.

Para além desses aspectos, essa cultura escolar opera com padrões de comportamento, de corpo, de saber, sendo uma de suas funções encaixar os estudantes em um modelo que é imposto como correto, moldando o sujeito dentro de um perfil de cidadão “culto”, “letrado”, perante o que é legitimado pela escola e pela sociedade.

É nesse cenário que a escola no Brasil se consolida como instituição, carregando as promessas da modernidade, sendo a ela conferida o papel de levar o indivíduo e a sociedade ao progresso e ao desenvolvimento.

Figura 3: perguntas norteadoras. 

Esses questionamentos nos são caros e guiarão toda nossa discussão ao longo desta primeira temática. Mas podemos dizer que esses problemas perpassam pela marginalização de grupos sociais e de sujeitos que chegam às escolas, porém se distanciam do modelo de cidadão que ainda nos é imposto como herança do passado colonial.

E quem são esses sujeitos? Sabemos bem quem são, pois eles têm cor, classe social, território, gênero e cultura bem definidos. São negros, moradores de periferia, quilombolas, indígenas, camponeses, mulheres e pessoas de diferentes orientações sexuais. Dialogando com a expressão de Miguel Arroyo (2012), são Outros sujeitos que hoje buscam seu reconhecimento em “ações, resistências e lutas”, mas que são ocultados, produzidos como invisíveis.

Ao trazer a expressão Outros, Arroyo (2012) diz sobre sujeitos e grupos sociais, como elencamos, que historicamente são tratados à margem da sociedade, perante os padrões sociais calcados pela colonização, mas que perduram ainda hoje. Assim, ao transportarmos essa ideia para as práticas escolares, é necessário pensarmos em projetos e práticas que reconheçam esses sujeitos e considerem suas experiências sociais e seus saberes como partes constitutivas dos projetos pedagógicos.


Quando se pensam os outros como marginais, excluídos, desiguais, inconscientes, se reconhece sua existência, é possível a copresença do Nós e do Outro [...] Logo os Outros, ao não existirem, não são passíveis de serem incluídos, nem reguláveis, nem emancipáveis, nem capazes de estar copresentes nos mesmos espaços e nas mesmas pedagogias.

ARROYO, 2012, p. 50, grifo nosso
Sugestão de material:

Reportagem - Alunos são proibidos de apresentar trabalho sobre entidade do candomblé

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As colocações apresentadas nos levam a refletir que a escola tende a transformar a cultura dominante em uma cultura universal, na cultura de todos os cidadãos que dela necessitam se apropriar. A escola, nesse sentido, acaba se configurando como um território descolado da realidade, isento e desprovido de interações humanas, de diálogos, de conflitos, um espaço homogeneizador, como temos conversado. Mas como mudar essa lógica?

Arroyo (2012) chama a atenção para a centralidade dada às ações desses Outros sujeitos nos espaços de conhecimento, nas diversas formas de organização da vida e de interação social. A chegada desses sujeitos nas escolas indica que aí pretendem marcar sua presença, muitas vezes contestadora. Nesse sentido, é necessário pensar em processos pedagógicos que considerem a diversidade dos sujeitos presentes na escola, bem como suas diferenças sociais.

O educador e pensador contemporâneo Paulo Freire, em sua vasta obra sobre educação, escreve de forma a provocar seus leitores a uma reflexão sobre a necessidade urgente de construção de uma sociedade melhor e humanizada. Sendo assim, ele nos convida a refletir sobre o contexto escolar e pedagógico, afirmando ser este um local de transformações e não apenas de reprodução de conhecimentos e desigualdades sociais.

Ao desconstruir e reconstruir elaborações pedagógicas orientadas por uma concepção de escola que ainda prevalece em nosso País, isto é, uma concepção meritocrática e homogeneizadora, evidenciamos os limites quando se acredita que o mérito será um instrumento de equidade educacional em uma sociedade histórica e contemporaneamente desigual como a brasileira.

Diante do exposto, perguntamos: como é possível pensar a respeito da equidade educacional na nossa sociedade? Enfatizamos que se faz cada vez mais necessária uma mudança profunda de perspectiva da sociedade e, especialmente, dos educadores e dos gestores escolares, sobre os estudantes e sobre os processos educativos. Essa mudança deve ser realizada com vistas a superar concepções universalistas e generalizantes, sendo assim necessário reconhecer a diversidade – racial, cultural, econômica, de gênero – dos sujeitos que estão nas escolas, e, a partir disso, pensar em novas perspectivas para o trabalho pedagógico.