Ao pensarmos as questões de gênero na organização das famílias, também são inúmeras as dificuldades e as vivências indignas daquelas que se afastam do padrão colonial. Por exemplo, uma mulher que escolhe ser mãe sem a presença do pai ainda sofre com preconceitos, como se não fosse possível vivenciar a maternidade sem a presença de um homem ao seu lado.
Inclusive, nesses casos, os filhos são estigmatizados, chamados pejorativamente em determinados lugares sociais de “filhos de mãe solteira”, sendo essa condição ainda um fator de subalternização do sujeito, infelizmente.
A violência é outra realidade que atinge essas mulheres diariamente. Abaixo apresentamos um infográfico sobre a taxa de homicídios de mulheres negras e de mulheres não negras:

Como vimos na figura a cima, a taxa de homicídios de mulheres negras se sobressai sobre a de não negras na maior parte das regiões. Isso pode ser reflexo do preconceito existente em nossa sociedade. Podemos descrever o preconceito como um julgamento prévio que formulamos a propósito de uma pessoa, de grupos de indivíduos ou de um povo que ainda não conhecemos. Essa atitude pode estar vinculada a várias motivações, como a cor da pele, a faixa etária, o gênero, a condição social, a estética, a origem geográfica.
O preconceito é muitas vezes enraizado, fruto de um imaginário social arraigado nas sociedades, como o racismo, a misoginia, a homofobia, dentre outras expressões do preconceito.
E, quando o preconceito se dá no âmbito das instituições, subalternizando sujeitos em relação a outros, entendemos que ele passa a ser institucionalizado, reforçando ainda mais as manifestações de preconceito individual, tendo em vista que estas estão legitimadas. O racismo institucional e o machismo institucional, por exemplo, ainda têm pautado dinâmicas sociais perversas entre famílias brasileiras.
Mãe solteira: os impactos de uma solidão feminina
Acessar conteúdo.
Aborto paterno: é possível colocar o nome do pai ausente na certidão de nascimento do filho
Acessar conteúdo.
Milhões de filhos brasileiros não são reconhecidos pelos pais
Acessar conteúdo.
Brasil tem 5,5 milhões de de crianças sem pai no registro
Acessar conteúdo.
É importante ressaltarmos que a responsabilidade da criação dos filhos quase sempre recai sobre a mulher, principalmente quando os pais não vivem juntos.
Por exemplo, no Brasil, milhões de crianças são abandonadas pelos pais ao nascerem, levando apenas o nome da mãe na certidão de nascimento – isso se chama “aborto paterno”. Esse fato demonstra que o modelo de família patriarcal, no qual as atribuições sociais dentro das famílias são bem definidas e fixas, não se sustenta em muitas vivências familiares.
Ainda sobre a questão de gênero, ao lançarmos o olhar para as famílias LGBTIQA+, percebemos que alguns processos que essas pessoas vivenciam para serem reconhecidas como família são cruéis. Os casos de pessoas LGBTIQA+ que são expulsas de casa por seus pais não são raros, e, em muitos casos, esse rompimento de dá simplesmente por esses sujeitos assumirem essa condição, de não ser hétero e de “fugir” aos padrões vistos como “adequados” na sociedade.
Dessa maneira, muitas crianças, adolescentes e jovens que se identificam como pertencentes a tal grupo abandonam as escolas, e muitas vezes se inserem em postos de trabalho precarizados, se envolvem com o uso e/ou tráfico de drogas, com a prostituição, e outras são obrigadas a lidar com a vida nas ruas.
Ao dialogarmos com Berquó (1999) e utilizar uma expressão desenvolvida por essa autora, podemos pensar que algumas das características primordiais das famílias brasileiras são as permanências e mudanças. Permanências pois a maioria das famílias ainda é composta de casais com filhos ou não, e verifica-se um número amplo de casamentos em relação a divórcios, mesmo que no ano de 2016 o número de casamentos tenha diminuído e o de divórcios aumentado. Um dos aspectos que nos leva a entender esse fato, como vimos, é que ainda há uma concepção patriarcal que legitima alguns modelos de família e inferioriza outros.