Saberes escolares X saberes da experiência

Convidamos os(as) leitores(as) a iniciar essa discussão dialogando com o antropólogo e educador Carlos Rodrigues Brandão, para quem a educação é constituída de diversos processos de ensinar e aprender, que são vivenciados não somente na escola, mas também em outras instâncias e espaços sociais. Nesse sentido:
Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender e ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Com uma ou com várias: educação? Educações.
É importante destacarmos, a partir da concepção exposta, que não há só uma educação, as pessoas vivenciam múltiplos processos educativos ao longo da vida, nos diversos espaços sociais em que circulam, interagem, socializam com o outro. Há, portanto, educações, e a educação escolar é apenas uma das formas pelas quais as pessoas se educam, por isso é muito importante diferenciar educação de escolarização.
A educação deve ser concebida a partir de um conceito plural e muito mais amplo, pois as pessoas vivenciam processos educativos no seio de suas famílias – em uma roda de samba, em uma celebração religiosa, no trabalho, ao contar e escutar um caso etc.
Assim, ao afirmar que a educação está em todos os lugares, Brandão (1985) nos convida a perceber que vivenciamos amplamente uma diversidade de experiências ao longo de nossas vidas, que produzem processos de socialização e aprendizados contínuos. Nessa diversidade de experiências, criamos e recriamos normas de convívio, condutas e papéis sociais necessários para a vida em sociedade, para a resolução de problemas cotidianos. A educação, assim, passa a estar atrelada à cultura e se torna responsável pela reelaboração de conhecimentos, tecnologias, saberes e práticas, nos revelando que há uma íntima relação entre cultura e educação.
Paulo Freire também nos ensina a importância dos saberes adquiridos ao longo da vida, nos diversos espaços sociais em que circulamos e interagimos com o outro. Ao denominá-los de saberes de experiência feito, Freire aponta que nós, homens e mulheres, em interação, estabelecemos relações de aprendizagem no e com o mundo, sendo que “para sabermos, é preciso apenas estar vivos, assim, as pessoas sabem” (FREIRE; HORTON, 2005, p. 86).
No entanto, muitas dessas formas de educação, desses saberes de experiência foram e são deslegitimados, ocultados, pois, como vimos, historicamente o processo de consolidação da instituição escolar no Brasil “foi também o processo de aniquilamento de muitas culturas tradicionais, com suas formas distintas de pensar e viver o mundo, trazendo, como consequência, um rastro de violência e autoritarismo cultural e social” (LEITE, 2016, p. 16).
Na medida em que essa lógica foi se estabelecendo, indo ao encontro de uma concepção homogeneizadora de sociedade, os saberes escolares foram se tornando cada vez mais abstratos, sem conexão com os sujeitos presentes na escola, além de distantes de suas realidades. Lembremos que, até o século passado, a escola se preocupou em transmitir, essencialmente, os chamados saberes acadêmicos, representados pelas disciplinas escolares: Ciências, Matemática, Geografia, História, dentre outras.
Ademais, foi a escola que se tornou responsável por repassar esses conhecimentos ao longo das gerações, objetivando sua perpetuação e os legitimando hierarquicamente como superiores em relação a outros conhecimentos. Os saberes escolares, portanto, representam uma seleção de conhecimentos ligados a uma tradição epistemológica hegemônica, além de serem difundidos como universais e neutros, se tornando desterritorializados e colocando à margem saberes outros, construídos na experiência de vida. Nessa perspectiva, perguntamos ao leitor e a leitora se essa condição acaba atuando para fortalecer a falta de conexão da escola com muitos estudantes, os tornando também mais desinteressados nessa forma de educação e nos revelando a necessidade de transformá-la. Diante dessa condição exposta, você já se questionou se a escola é apenas reprodutora de lógicas e desigualdades sociais?
Desinteresse; não conseguem aprender; não se sentem parte da escola; baixa
autoestima; falta de apoio familiar; falta de estrutura de aprendizado anterior, como escrita, compreensão de textos etc.