Experiências de educação integral: a formação do sujeito em sua integralidade

Convidamos o(a) leitor(a), nesta unidade, a pensar as estratégias de aproximação dos estudantes com a escola a partir de experiências de Educação Integral, que pressupõe a formação dos estudantes não apenas na dimensão cognitiva, mas também nas dimensões política, afetiva, social e cultural. Nesse sentido, o tempo, na escola, deve ser ressignificado, preenchido com novas oportunidades, visando à aprendizagem e à reapropriação dos espaços de sociabilidade e de comunicação. Assim, a Educação Integral,
necessariamente, deverá constituir-se como um tempo reinventado que, compreendendo os ciclos, as linguagens, os desejos das infâncias e juventudes que acolha, modifique assimetrias e esterilidades que ainda são encontradas na prática pedagógica escolar.
Salientamos ao(à) leitor(a) a importância de destacar que a Educação Integral não se limita à ampliação do tempo de escola, embora mais tempo de escola possa ser importante para o desenvolvimento de projetos diferenciados. Ela significa, eminentemente, um trabalho pedagógico que trata o estudante em sua integralidade.
Pensar em Educação Integral, portanto, é pensar também a realidade educacional em que nossas crianças, adolescentes e jovens estão inseridos, sobretudo os das camadas populares. É pensar em como esses(as) jovens percebem e interrogam os currículos, bem como as práticas no interior da escola, e demandam outras pedagogias. Isso no intuito de buscarmos, como educadores, construir e desenvolver processos educativos mais conectados com as vivências e as demandas de conhecimento e saberes das infâncias, adolescências e juventudes contemporâneas.
Vamos conhecer a experiência de um projeto de Educação Integral denominado Jovens Urbanos, desenvolvido em uma escola pública do bairro Cidade Tiradentes, localizado na região Leste de São Paulo. A escola mantém uma parceria com o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec) e com a Fundação Itaú Social.
Convido o(a) leitor(a) a assistir ao vídeo que apresenta relatos de jovens estudantes de escolas públicas do distrito de Cidade Tiradentes, na zona leste de São Paulo, falando sobre o processo de exploração e construção de cartografias a partir de diversos roteiros temáticos de circulação sobre o bairro, discutindo as questões de gênero e étnico-raciais.
O trabalho foi desenvolvido com consultoria de Cibele Lucena e condução do educador Claudio Pavão, do Instituto Pombas Urbanas.
Fonte: Programa Jovens Urbanos (2015).
Agora é com você, prezado(a) educador(a)! Você conhece algum projeto em Educação Integral? Na sua escola, já foi desenvolvido algum projeto parecido? Vamos dialogar sobre eles?
Como podemos perceber, nessa experiência foram trabalhados aspectos da realidade juvenil, que em uma lógica tradicional de escola talvez não pudesse ser trabalhada junto aos estudantes. A escola, ao propor o conhecimento aprofundado das questões sociais da cidade e que hoje perpassam as infâncias, adolescências e juventudes, certamente contribuiu para um sentimento de pertencimento dos estudantes em relação ao espaço escolar, bem como propiciou uma construção de conhecimento intimamente ligada aos sujeitos ali presentes.
A experiência do Projeto Jovens Urbanos, como vimos, lidou com a diversidade de sujeitos que na escola estão, bem como com questões e fenômenos sociais inerentes a eles. Como temos dialogado, é comum, hoje, observarmos estudantes negras e negros passando pela chamada transição capilar, assumindo com orgulho seus cabelos crespos, suas ancestralidades afro-brasileiras.
Há escolas acolhendo jovens de diferentes orientações sexuais, ou que estão em processo de construção de suas identidades, sendo necessário articular aos processos educativos a pauta de gênero, bem como a necessidade de pensar a solução de problemas que decorrem dessa temática, o que demanda, dentre outros elementos, a discussão contínua sobre raça, negritude e branquitude nas escolas – aspectos estes abraçados pelo projeto Jovens Urbanos.
Nessa dimensão, cada jovem, em sua individualidade, carrega em si formas de ver o mundo e saberes distintos, que se complementam no dia a dia escolar e pautam processos educativos também diversos e que precisam fazer parte dos planejamentos e dos projetos que serão desenvolvidos. Isso é trabalhar na perspectiva da Educação Integral.
Fonte: TEIA - UFMG (2013).
Sabemos que podem haver muitas estratégias a ser utilizadas pelos gestores e educadores escolares para ressignificar tempos e espaços educativos, buscando o desenvolvimento da Educação Integral. Exemplos dessas estratégias são as rodas de conversas, ciclos de debates, sessões de cinema, desenvolvimento de aulas-passeio, projetos interdisciplinares, incentivo à construção de grêmios estudantis e ao protagonismo juvenil, campeonatos esportivos, apresentações artísticas, gincanas, inserção dos jovens em pesquisas de iniciação científica júnior etc.
Essas ações são capazes de quebrar a lógica compartimentada da escola e sinalizam possibilidades novas para a formação das infâncias e juventudes. Mas é preciso ir mais além, fazer da Educação Integral um projeto político e emancipatório para todos e para cada um, respeitando as individualidades e buscando a coletividade nos processos de tomadas de decisões na escola.

Convidamos o(a) leitor(a) a conhecer uma experiência exitosa, desenvolvida em uma escola pública da cidade de São Paulo, o Projeto Cisternas nas Escolas . Nesse projeto, os estudantes, com a mediação dos professores, desenvolveram um esquema de captação e armazenamento da água da chuva para que essa água pudesse ser reaproveitada na escola. O projeto envolveu estudantes do sexto ano do Ensino Fundamental e, ao longo de seu desenvolvimento, além de terem sido mobilizados conhecimentos de diversas áreas, foram propostas discussões importantes e atuais, como a crise hídrica, o abastecimento de água, dentre outras.
Outra experiência exitosa que muito nos ensina está sendo desenvolvida em Joinville (SC), em que se relaciona a questão racial com o ensino de Matemática. Esse projeto foi desenvolvido a partir da concepção da etnomatemática, que leva em consideração o fato das diversas culturas produzirem conhecimento, mas conhecimentos que muitas vezes são apagados pela narrativa da escola, não sendo incluídos em seus currículos. Nesse sentido, surge a afroetnomatemática, que lida com a matemática a partir da cultura dos povos africanos.
O(A) leitor(a) pode perceber que são muitas as experiências em todas as regiões do Brasil, como as que vimos, que têm se dedicado a respeitar as manifestações de vida presentes na escola, abrindo possibilidades para a construção de conhecimentos ricos em significados e que talvez não estejam prescritos em listas de conteúdos, mas se dispõem na experiência cotidiana, no acontecer da vida de cada um que ali está.
Podemos, desta forma, chegar a uma breve conclusão de que, ao refletirmos sobre Educação Integral e suas articulações com os sujeitos – crianças, adolescentes e jovens que estão na escola –, precisamos, como educadores, cada vez mais, “descolonizar” o nosso olhar para com a escola, buscando empreender processos educativos a partir desse novo olhar.
Por todos esses aspectos, por exemplo, quando centralizarmos as condições de pobreza dos estudantes beneficiários do Programa Bolsa Família, precisamos enxergar que as dimensões abarcadas pela Educação Integral podem mudar realidades e superar, em alguns aspectos, desigualdades. Portanto, é necessário transformar a ação educativa. Precisamos resistir e (re)existir nas escolas, em diálogo, coletivamente!