UNIDADE 3

Estratégias Pedagógicas e as formas de lidar com as violências

 

Iniciamos este módulo com a seguinte questão: como a presença das violências interfere no convívio escolar e, consequentemente, na qualidade do ensino e nas trajetórias escolares?

 Sem dúvida, os desafios da escola são grandes e estão correlacionados com aspectos macropolíticos e sociais (como as questões de cunho socioeconômico) e com a própria constituição social das subjetividades e dos processos de internalização das suas práticas. É importante refletirmos sobre o que a escola pretende e também compreender que não se trata apenas de querer ensinar ou determinar novos hábitos ou comportamentos de “como os estudantes devem se portar diante do outro”, mas, acima de tudo, de um processo de empatia, em que o sofrimento do outro é sentido também em mim. Por isso, a visão do educador deixa de ser de uma posição de expectador das injustiças sociais para aquele que quer modificá-las.

Assim, antes de refletirmos sobre estratégias pedagógicas, temos que entender que para, enfrentar tais problemas – tão amplos e complexos –, a escola, em conjunto com todos aqueles que estão envolvidos com ela, devem começar suas estratégias pedagógicas com uma verdadeira disposição de escutar os seus alunos.

Nessa perspectiva, trazemos aqui uma experiência exitosa vivenciada por um grupo de pesquisa da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em São Paulo, onde foram  desenvolvidas as chamadas Oficinas de Experimentações, por meio de exercícios elaborados pela equipe. A ideia de expor as formas de trabalho desenvolvidas em uma escola pública não tem intenção de servir como manual ou cartilha para professores, mas traz a proposta de pensar sobre possibilidades e reflexões sobre a temática.

Exemplo de estratégia pedagógica: oficina de experimentação 

1. ObjetivoO objetivo da Oficina de Experimentação era analisar os discursos e identificar o desenvolvimento de alteridades e o favorecimento da igualdade educativa e social de estudantes por meio de elementos textuais, artísticos e cinematográficos em processos criativos, além de contribuir para o projeto de vida de alunos do Ensino Fundamental (anos finais) e do Ensino Médio, na área de Linguagens e Códigos. Os conteúdos desenvolvidos estavam relacionados à elaboração de textos expositivos (poesias, depoimentos, fábulas, cartas etc.); fotografias e audiovisuais; linguagem verbal e linguagem não verbal; e gêneros textuais: argumentação e artigo de opinião.


2.
 Metodologia: A metodologia escolhida para discutir os aspectos diversos do tema violências foi a baseada na perspectiva do processo e do produto. Em 15 semanas de encontros semanais (de uma hora e quarenta minutos), produzimos materiais escritos e audiovisuais elaborados pelos estudantes que, a partir de diferentes propostas, intituladas de “exercícios”, puderam (re)observar e debater sobre os desafios da juventude com três perspectivas: no mundo, na escola e nas relações interpessoais.

Em cada uma dessas perspectivas, tivemos o propósito de relacionar os quatro tipos de violências: física, verbal, psicológica e simbólica. Essa metodologia é inspirada no projeto Inventar com a Diferença – cinema, educação e direitos humanos (MIGLIORIN, 2014) que também é trabalhada em escolas brasileiras com diferentes projetos.

3. Desenvolvimento: Durante os processos criativos propostos, todos os envolvidos foram desafiados a adotar diferentes perspectivas, possibilitando novos espaços para repensar as relações com o entorno e com si mesmo. Foram desenvolvidas várias atividades com esses estudantes,  com o propósito de ouvi-los, para compreender como as violências acontecem e como elas eram vistas por eles no ambiente escolar. Por meio da Oficina de Experimentação desenvolvemos exercícios que são compreendidos como um conjunto de regras e/ou desafios. As turmas foram divididas em quatro grupos (conforme a sugestão das quatro violências) para que os(as) alunos(as) pudessem ser ouvidos de forma diferenciada. A cada três semanas (perspectiva de mundo, escola e relações interpessoais) os grupos trocavam os exercícios para uma nova violência. Ao final, todos os estudantes discutiram todas as violências, nas três perspectivas propostas.

Ao elaboramos esses exercícios (construídos a cada aula) para debater os quatro tipos de violências, os alunos foram protagonistas tanto no processo – quando selecionaram exemplos e temas abordados – quanto no produto final (material escrito ou audiovisual). Antes de refletirem e elaborarem suas produções, os alunos eram convidados a debater o que compreendiam sobre o tema.

A partir do exposto podemos definir, diante das Oficinas de Experimentações, que a violência física no interior da escola se dá no uso intencional da força física, contra outra pessoa ou contra um grupo, que resulta em ferimentos, danos ou privações, como: segurar alguém contra parede; tapas; empurrões; socos; beliscões; pontapés; puxar blusa ou mochilas; arranhar; colocar pé para tropeçar; brigas; jogar coisas (objetos) no outro; e coagir, impedindo a passagem por meio da força física.

Dessa forma, convidamos os(as) leitores(as) a assitir ao vídeo abaixo que aborda sobre: as agressões em professores; aluna morta por bala perdida dentro da escola; e arrastões. São quadros de violência que se tornaram comuns nas escolas. Como combater essas situações e garantir um aprendizado saudável para as crianças e adolescentes.

Acessar vídeo.

Nesse sentido, no intuito de explicitar os tipos de violência que ocorrem no interior da escola, elencamos três tipos:

1. Violência verbal no interior da escola: Ocorre com o uso intencional de agredir verbalmente, como: falar palavrões; xingar alguém; desacato; humilhações; impedir de se expressar; coagir por meio de gozações em grupo (ridicularizar); mandar calar a boca; colocar apelidos; gritar; e ameaçar. Gómez (1998) traz em seus estudos reflexões sobre as relações entre professores e alunos dentro da sala de aula, e explicita que existe, muitas vezes, uma aparente disciplina e ordem ditada pela autoridade de docentes, mas nas aulas acontecem diferentes interações, em que permeiam diversos interesses e trocas de ideias explícitas ou disfarçadas. O ambiente escolar acaba por proporcionar o sofrimento e reproduzir situações violentas, sem possíveis diálogos.

Consiste em uma atitude (não física) específica por parte do agressor. Essa atitude pode ser individual ou em grupo num dado momento ou situação, como: rejeição, depreciação, indiferença, discriminação, desrespeito, punições (exageradas) etc.

 

2. Violência psicológica no interior da escola: Compreendida como aquela que subjaz a toda e qualquer forma de abuso, é considerada de complexa identificação devido a seu caráter subjetivo. Outra particularidade desse tipo de violência é a influência de aspectos culturais e históricos que podem ser observados nos mais diversos contexto, inclusive o escolar. Caso esses comportamentos sejam nocivos ao coletivo, seus autores podem não se sentir culpados pelos danos causados devido ao desengajamento moral instaurado.

 

3. Violência simbólica no interior da escola: Acontecem quando discentes, gestores, docentes etc. aplicam punições específicas a outros estudantes, em função de suas condutas fora dos padrões estabelecidos. Ela é praticada por meio de discursos, pensamentos, procedimentos, anseios padronizados pela prática escolar e social que, infelizmente, não são percebidos devido à ausência de espaços para refletir-se sobre suas evidências nocivas dentro do ambiente escolar. A violência simbólica, para Lembo (1975), também é caracterizada como uma exclusão do(a) aluno(a) dentro da própria sala de aula, como: alienação; apatia; ressentimento; tédio; atitude destrutiva e agressões de todos os tipos. Para Guimarães e Júnior Oliveira (2014), a violência simbólica no campo educacional acontece com um poder invisível.