Sociedade medicalizada e o território escolar

O que é uma sociedade medicalizada? Que relação podemos estabelecer entre aprendizagem e medicalização da vida e da sociedade? A resposta vem de pronto e a um só tempo: tantas e nenhuma. Não negamos a real necessidade de medicações que têm objetivo de melhorar a qualidade de vida de pessoas que, de fato, têm distúrbios ou transtornos mentais. Entretanto, vamos direcionar nossa crítica a um processo que ocorre em larga escala atualmente, de uso e de abuso de encaminhamentos de crianças, adolescentes e jovens para profissionais de saúde por excesso de queixa escolar e indisciplina. Muitas vezes, o resultado desse excesso de encaminhamentos são diagnósticos frágeis relativos às dificuldades de aprendizagem, e, nesse sentido, a escola colabora com a indústria farmacêutica na produção e distribuição de medicamentos. É esse último ponto que nos interessa neste momento.
Existem casos em que as escolas e os profissionais da educação orientam os pais e responsáveis a procurarem ajuda médica por excesso de queixa de inquietamento e indisciplina escolar. Quando isso acontece, sem terem sido todas as outras possibilidades como recursos pedagógicos e acolhimento afetivo esgotadas, acreditamos que a escola está contribuindo para a reprodução do discurso da patologização da vida e atuando na contramão de uma educação crítica, criativa e emancipatória.
A patologização da vida é um processo no qual características físicas e psíquicas, antes toleradas ou aceitas pela sociedade, passam a ser consideradas patológicas, ou seja, passam a ser relacionadas a problemas de saúde, tais como distúrbios, síndromes e transtornos. Essa relação entre o que era “normal” e que agora é um problema de saúde é intermediado pelo saber médico que, por vezes, tende a tratar como "anormal" um comportamento antes considerado "normal". Um ótimo exemplo para ilustrar esse processo e no qual características antes consideradas inerentes à infância – tais quais agitação, imaginação excessiva, pouca atenção a certas normas sociais – hoje tendem a ser entendidas como sinais de patologias, a exemplo de transtorno de déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), dislexia, discalculia etc.
Você se lembra do menino maluquinho?

“Menino maluquinho não existe mais, está rotulado e recebendo psicotrópicos para TDAH” (MOYSÉS; COLLARES, 2013, p. 44).
“TDAH” é a sigla para Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. Esse diagnóstico normalmente é atribuído às crianças. E por que será que isso acontece? Bem, vejamos algumas características que são consideradas sinais de TDAH:
A característica essencial do transtorno de déficit de atenção/hiperatividade é um padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade-impulsividade que interfere no funcionamento ou no desenvolvimento. A desatenção manifesta-se comportamentalmente no TDAH como divagação em tarefas, falta de persistência, dificuldade de manter o foco e desorganização - e não constitui consequência de desafio ou falta de compreensão. A hiperatividade refere-se a atividade motora excessiva (como uma criança que corre por tudo) quando não apropriado ou remexer, batucar ou conversar em excesso.